COLÉGIO
MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL THEÓPHILO SAUER
Planejamento: Trabalho com o Conto o Tesouro, de Eça
de Queirós.
1.
Objetivos: Trabalhar o gênero conto de terror.
2.
Conteúdos: Conto, interpretação do texto e produção textual.
3.
Tempo:2 períodos
4.
Recursos: Texto
xerocado e a introdução da atividade textual aos alunos.
5.
Procedimento:
-
Atividade de motivação;
-
Leitura individual do conto;
-
Distribuição dos textos aos alunos;
-
Interpretação do conto;
6. Avaliação:
Avaliação será dada a partir das produções e da
participação do aluno.
Av.
Oscar Martins Rangel, 4500 (RS 115) – CP
84 – CEP 95600-000 Taquara/RS – Fone:
(51) 3541.6600 – Fax: (51) 3541.6626 – www.faccat.br
Escola Municipal Theóphilo Sauer –
Turma: 213 Aula de Português
Aluno(a):
________________________________________ n.º: _____
PROFESSORES BOLSISTAS: JANAÍNA DA
ROSA E ELEMAR GOMES
O TESOURO
Eça de Queirós
Nos Paços de
Medranhos, a que o vento da serra levara vidraça e telha, passavam eles as
tardes desse Inverno, engelhados nos seus pelotes de camelão, batendo as solas
rotas sobre as lajes da cozinha, diante da vasta lareira negra, onde desde
muito não estalava lume, nem fervia a panela de ferro. Ao escurecer devoravam
uma côdea de pão negro, esfregada com alho.
Ora, na
Primavera, por uma silenciosa manhã de domingo, andando todos três na mata de
Roquelanes a espiar pegadas de caça e a apanhar tortulhos entre os robles,
enquanto as três éguas pastavam a relva nova de Abril – os irmãos de Medranhos
encontraram, por trás de uma moita de espinheiros, numa cova de rocha, um velho
cofre de ferio. Como se o resguardasse uma torre segura, conservava as suas
três chaves nas suas três fechaduras. Sobre a tampa, mal
Av. Oscar Martins Rangel, 4500
(RS 115) – CP 84 – CEP 95600-000
Taquara/RS – Fone: (51) 3541.6600 – Fax: (51) 3541.6626 – www.faccat.br
decifrável
através da ferrugem, corria um dístico em letras árabes. E dentro, até às
bordas, estava cheio de dobrões de ouro!
– Bem
tramado! – gritou Rostabal, homem mais alto que um pinheiro, de longa guedelha,
e com uma barba que lhe caía desde os olhos raiados de sangue até á fivela do
cinturão.
Mas Guanes
não se arredava do cofre, enrugado, desconfiado, puxando entre os dedos a pele
negra do seu pescoço de grou. Por fim, brutalmente:
– Manos! O
cofre tem três chaves... Eu quero fechar a minha fechadura e levar a minha
chave!
– Também eu
quero a minha, mil raios! – rugiu logo Rostabal.
Rui sorriu.
Decerto, decerto! A cada dono do ouro cabia uma das chaves que o guardavam. E
cada um em silêncio, agachado ante o cofre, cerrou a sua fechadura com força.
Imediatamente Guanes, desanuviado, saltou na égua, meteu pela vereda de olmos,
a caminho de Retortilho, atirando aos ramos a sua cantiga costumada e dolente:
Olé! Olé!
Sale la cruz de
la iglesia,
Vestida de
negro luto...
II
Na clareira,
em frente à moita que encobria o tesouro (e que os três tinham desbastado a
cutiladas) um fio de água. brotando entre rochas: caía sobre uma vasta laje
escavada, onde fazia como um tanque, claro e quieto, antes de se escoar para as
relvas altas. E ao lado, na sombra de uma faia, jazia um velho pilar de
granito, tombado e musgoso. Ali vieram sentar-se Rui e Rostabal, com os seus
tremendos espadões entre os joelhos. As duas éguas retouçavam a boa erva
pintalgada de papoulas e botões-de-ouro. Pela ramaria andava um melro a
assobiar. Um cheiro errante de violetas adoçava o ar luminoso. E Rostabal,
olhando o Sol, bocejava com fome.
Então Rui,
que tirara o sombreiro e lhe cofiava as velhas plumas roxas, começou a
considerar, na sua fala avisada e mansa, que Guanes, nessa manhã, não quisera
descer com eles à mata de Roquelanes. E assim era a sorte ruim! Pois que se
Guanes tivesse quedado em Medranhos, só eles dois teriam descoberto o cofre, e
só entre eles dois se dividiria o ouro! Grande pena! Tanto mais que a parte de
Guanes seria em breve dissipada, com rufiões, aos dados, pelas tavernas.
– Ah!
Rostabal, Rostabal! Se Guanes, passando aqui sozinho, tivesse achado este ouro,
não dividia conosco, Rostabal!
O outro
rosnou surdamente e com furor, dando um puxão às barbas negras:
– Não, mil
raios! Guanes é sôfrego... Quando o ano passado. se te lembras, ganhou os cem
ducados ao espadeiro de Fresno, nem me quis emprestar três para eu comprar um
gibão novo!
– Vês tu? –
gritou Rui, resplandecendo.
Ambos se
tinham erguido do pilar de granito, como levados pela mesma idéia, que os
deslumbrava. E, através das suas largas passadas, as ervas altas silvavam.
– Pois que morra,
e morra hoje! – bradou Rostabal.
– Queres?
Vivamente,
Rui agarrara o braço do irmão e apontava para a vereda de olmos, por onde
Guanes partira cantando:
– Logo
adiante, ao fim do trilho, há um sítio bom, nos silvados. E hás-de ser tu,
Rostabal, que és o mais forte e o mais destro. Um golpe de ponta pelas costas.
E é justiça de Deus que sejas tu, que muitas vezes, nas tavernas, sem pudor,
Guanes te tratava de «cerdo» e de «torpe», por não saberes a letra nem os
números.
– Malvado!
– Vem!
Foram. Ambos
se emboscaram por trás de um silvado que dominava o atalho, estreito e
pedregoso como um leito de torrente. Rostabal, assolapado na vala, tinha já a
espada nua. Um vento leve arrepiou na encosta as folhas dos álamos – e sentiram
o repique leve dos sinos de Retortilho. Rui, coçando a barba, calculava as
horas pelo Sol, que já se inclinava para as serras. Um bando de corvos passou
sobre eles, grasnando E Rostabal, que lhes seguira o roo, recomeçou a bocejar,
com tome, pensando nos empadões e no vinho que o outro trazia nos alforjes.
Enfim!
Alerta! Era, na vereda, a cantiga dolente e rouca, atirada aos ramos:
Olé! Olé!
Sale la cruz de
la iglesia,
Vestida de
negro luto...
Rui
murmurou: – Na ilharga! Mal que passe! – O chouto da égua bateu o cascalho. uma
pluma num sombrero vermelhejou por sobre a ponta das silvas.
Rostabal
rompeu de entre a sarça por uma brecha, atirou o braço, a longa espada – e toda
a lâmina se embebeu molemente na ilharga de Guanes, quando ao rumor,
bruscamente ele se virara na sela. Com um surdo arranco, tombou de lado, sobre
as pedras. Já Rui se arremessava aos freios da égua – Rostabal. caindo sobre
Guanes, que arquejava, de novo lhe mergulhou a espada, agarrada pela folha como
um punhal, no peito e na garganta.
– A chave! –
gritou Rui.
E arrancada
a chave do cofre ao seio do morto, ambos largaram pela vereda – Rostabal
adiante, fugindo, com a pluma do sombrero quebrada e torta, a espada ainda nua
entalada sob o braço, todo encolhido, arrepiado com o sabor do sangue que lhe
espirrara para a boca: Rui, atrás, puxava desesperadamente os freios da égua,
que, de patas fincadas no chão pedregoso, arreganhando a longa dentuça amarela.
não queria deixar o seu amo assim estirado, abandonado, ao comprido das sebes.
Teve de lhe
espicaçar as ancas lazarentas com a ponta da espada – e foi correndo sobre ela,
de lâmina alta, como se perseguisse um mouro, que desembocou na clareira onde o
sol já não dourava as folhas. Rostabal arremessara para a relva o sombrero e a
espada; e debruçado sobre a laje escavada em tanque, de mangas arregaçadas,
lavava, ruidosamente, a face e as barbas.
A égua,
quieta, recomeçou a pastar, carregada com os alforjes novos que Guanes comprara
em Retortilho. Do mais largo, abarrotado, surdiam dois gargalos de garrafas.
Então Rui tirou, lentamente, do cinto, a sua larga navalha. Sem um rumor na
relva espessa, deslizou até Rostabal, que resfolegava, com as longas barbas
pingando. E serenamente, como se pregasse urna estaca num canteiro, enterrou a
folha toda na largo dorso dobrado, certeira sobre o coração.
Rostabal
caiu sobre o tanque, sem um gemido, com a face na água, os longos cabelos
flutuando na água. A sua velha escarcela de couro ficara entalada sob a coxa.
Para tirar de dentro a terceira chave do cofre, Rui solevou o corpo – e um
sangue mais grosso forrou, escorreu pela borda do tanque, fumegando.
III
Abriu as
três fechaduras, apanhou um punhado de dobrões, que fez retinir sobre as
pedras. Que puro ouro, de fino quilate! E era o seu ouro! Depois foi examinar a
capacidade dos alforjes – e encontrando as duas garrafas de vinho, e um gordo
capão assado, sentiu uma imensa fome. Desde a véspera só comera uma lasca de
peixe seco. E há quanto tempo não provava capão!
Com que
delícia se sentou na relva, com as pernas abertas, e entre elas a ave loura,
que recendia, e o vinho cor de âmbar! Ah! Guanes fora bom mordomo – nem
esquecera azeitonas. Mas porque trouxera ele, para três convivas, só duas
garrafas? Rasgou uma asa do capão: devorava a grandes dentadas. A tarde descia,
pensativa e doce, com nuvenzinhas cor-de-rosa.
Rui ergueu à
luz a garrafa de vinho. Com aquela cor velha e quente, não teria custado menos
de três maravedis. E pondo o gargalo à boca, bebeu em sorvos lentos, que lhe
faziam ondular o pescoço peludo. Oh vinho bendito, que tão prontamente aquecia
o sangue! Atirou a garrafa vazia – destapou outra. Mas, como era avisado, não
bebeu, porque a jornada para a serra, com o tesouro, requeria firmeza e acerto.
Estendido sobre o cotovelo, descansando, pensava em Medranhos coberto de telha
nova, nas altas chamas da lareira por noites de neve, e o seu leito com
brocados, onde teria sempre mulheres.
De repente,
tomado de urna ansiedade, teve pressa de carregar os alforjes. Já entre os
troncos a sombra se adensava. Puxou uma das éguas para junto do cofre, ergueu a
tampa. tomou um punhado de ouro... Mas oscilou, largando os dobrões, que
retilintaram no chão, e levou as duas mãos aflitas ao peito. Que é, D. Rui?
Raios de Deus! Era um lume, um lume vivo, que se lhe acendera dentro, lhe subia
até às goelas. Já rasgara o gibão, atirava os passos incertos, e, a arquejar,
com a língua pendente. limpava as grossas bagas de um suor horrendo que o
regelava como neve. Oh Virgem Mãe! Outra vez o lume, mais forte, que alastrava,
o roía! Gritou:
– Socorro!
Alguém! Guanes! Rostabal!
Os seus
braços torcidos batiam o ar desesperadamente. E a chama dentro galgava – sentia
os ossos a estalarem como as traves de uma casa em fogo.
Cambaleou
até à fonte para apagar aquela labareda, tropeçou sobre Rostabal; e foi com o
joelho fincado no morto, arranhando a rocha, que ele, entre uivos, procurava o
fio de água. que recebia sobre os olhos, pelos cabelos. Mas a água mais o
queimava, como se fosse um metal derretido. Recuou. caiu para cima da relva.
que arrancava aos punhados, e que mordia, mordendo os dedos, para lhe sugar a
frescura. Ainda se ergueu. com uma baba densa a escorrer-lhe nas barbas: e de
repente; esbugalhando pavorosamente os olhos, berrou, como se compreendesse
enfim a traição, todo o horror:
– É veneno!
Oh! D. Rui,
o avisado, era veneno! Porque Guanes, apenas chegara a Retortilho, mesmo antes
de comprar os alforjes, correra cantando a uma viela, por detrás da catedral, a
comprar ao velho droguista judeu o veneno que, misturado ao vinho, o tornaria a
ele, a ele somente, dono de todo o tesouro.
Anoiteceu.
Dois corvos, de entre o bando que grasnava além nos silvados, já tinham pousado
sobre o corpo de Guanes. A fonte, cantando. lavava o outro morto. Meio
enterrado na erva negra, toda a face de Rui se tornara negra. Uma estrelinha
tremeluzia no céu.
O tesouro
ainda lá está, na mata de Roquelanes.
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