Das
ruas às urnas, das urnas às ruas
No
balanço parcial das manifestações juvenis que varrem as ruas brasileiras, uma
das boas baixas foi a mentira que prosperava no exterior, por causa da visão
preguiçosa dos correspondentes estrangeiros – a de que o país estava às portas
do Primeiro Mundo, não mais na condição de pedinte. Era com espanto que os
(poucos) curiosos em relação ao Brasil recebiam, na Europa, a informação de que
não era exata aquela história do Cristo Redentor decolando como foguete, para
ficar na capa famosa da revista inglesa The
Economist. O Brasil avançara? Sem dúvida. Mas menos pelas nossas qualidades
do que pela conjuntura favorável e pela inércia natural que faz com que o
amanhã seja melhor do que ontem nas latitudes onde tudo já esteve pior do que
nunca.
As
manifestações puseram óculos nos jornalistas internacionais. Enxerga-se, agora,
que o nosso crescimento não passa de transtorno dismórfico coletivo. Que o
tamanho absoluto do PIB é produto de uma ficção cambial. Que a escalada da
“nova classe média” acontece de dez em dez prestações. Que nosso nível
educacional só seria piada se fôssemos capazes de entendê-la. Que os miseráveis
ascenderam socialmente – mas à condição de pobres alimentados por programas de
esmola com dinheiro público. Que as nossas cidades são de uma esqualidez
vergonhosa. Que a frase do historiador latino Tácito nos cai à perfeição: em
uma república muito corrupta, numerosas são as leis.
Eles
não queriam ver e nós custamos a crer. A perda de contato com a realidade
paralisou as consciências no Brasil, de maneira patológica, mesmo se se
descontar a perturbada psicologia nacional. Chegamos a esse ponto através da
substituição da propaganda da política pela propaganda política. Por propaganda
da política entende-se a divulgação de ideários que exigem a tomada de
posições, os conflitos e a negociação no âmbito institucional – compreendida
como a busca de consensos que permitam à nação progredir na totalidade. Esse
fundamento, nunca inteiramente assimilado pelos brasileiros, foi subvertido
pela propaganda política, cuja essência é o discurso que só prevê a supressão
do que lhe é contrário. Os mais adestrados no recurso, está óbvio, são os
ditadores. No Brasil, a presença de um líder deletério, embora não tenha sido
suficiente para deletar as instituições, enfraqueceu-as tanto que hoje elas se
acham quase sem peso específico. O fenômeno ocorreu com o concurso do marketing
personalista e a troca da negociação pela negociata. Os eventuais oponentes
também se autoanularam, por motivos que apontam na direção do raquitismo das
convicções e da falta de responsabilidade, o que inclui desonestidade. A
oposição só renasce fugazmente durante as campanhas eleitorais.
Quando escasseia a propaganda da política e sobra a propaganda política,
o vácuo se instaura – um tipo de vácuo em que, à diferença do espacial, a
combustão é possível. Longe de ser colusão com a tentativa de ninjas, najas,
jiboias e cascavéis de instrumentalizá-las, constate-se que as manifestações
espocaram nesse contexto. Acusam-se os participantes de rejeitar a política.
Aplicam-lhes o rótulo de “fascistas”, como se houvesse uma agenda autoritária a
dirigir a maioria. A verdade, no entanto, é que as demonstrações são fruto da
refutação da política pelos próprios políticos. Como exigir de jovens crescidos
na audiência de disputas por butins que façam o elogio da representação
democrática? As indignações antipolíticas não explodiram por excesso de
política, mas por ausência dela, ainda que isso soe paradoxal.
A
juventude brasileira não sabe o que é política, e outra vez a culpa é dos
políticos. Eles transpuseram todas as fronteiras da decadência. Agora, diante
da exposição das nossas fragilidades, não conseguem simular dedicação a
interesses que ultrapassam o comprimento das hélices dos seus helicópteros.
Desconhecem que, até nos regimes absolutos, um governante tem de evitar o ódio
do povo – e o melhor modo de fazê-lo é abster-se de apropriar-se da propriedade
alheia. Surpreendidos pelas ondas de choque juvenis, correm para aprovar leis
demagógicas, ignorando que há legislação capaz de frear a corrupção se ela não
é precedida pelos bons costumes.
Os
políticos brasileiros desconhecem e ignoram, enfim, o que escreveu Niccolò
Machiavelli, no século XVI, muito antes do nascimento da democracia moderna, no
rastro das fúrias populares do seu tempo e da Antiguidade do historiador
Tácito. Em meio ao tumulto, ninguém faz ideia de por onde começar a pôr a casa
em ordem. Mas começar logo é imperativo. Para que a decolagem do Brasil não dê
chabu, seja mais do que um truque gráfico, e os correspondentes estrangeiros
tirem os óculos e voltem a relaxar, a propaganda política precisa dar lugar,
com urgência, à propaganda da política. Das ruas às urnas, das urnas às ruas.
ALUNO (A):
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DATA:
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TURMA: 205
PROFESSORA: Cristiane Cornely; Josiani da S. Pospichil; Lisandra Kohlrausch.
DISCIPLINA: Língua
Portuguesa
Tendo em vista o texto Das
ruas às urnas, das urnas às ruas, responda às questões abaixo:
1) A que acontecimento o jornalista faz
referência no título, “Das ruas às urnas”, de seu artigo?
Resposta:
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2) O autor vê com bons olhos as baixas em
relação a imagem, no exterior, de que o Brasil “[...] estava às portas do
Primeiro Mundo, não mais na condição de pedinte (linhas 3 e 4)? Que palavra
expressa isso?
Resposta:
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3) Que palavras e expressões do texto são
pejorativas em relação à política brasileira?
Resposta:
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4) O texto apresenta uma diferenciação
entre “propaganda da política” e “propaganda política”. A diferença entre as
duas expressões serve de argumento para o autor expressar sua opinião. O que as
diferencia? Que argumento é esse?
Resposta:
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5) Complete a seguinte afirmação:
A expressão “uma república muito corrupta”
(linha 17) pressupõe que o Brasil seja um país em que os políticos são
__________________________________.
6) Que informação contida no primeiro
parágrafo do texto permite ao leitor identificá-lo como um texto atual?
Resposta:
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7) Mario
Sabino afirma que “As manifestações puseram óculos nos
jornalistas internacionais” (linha 10).
Que realidade brasileira elas mostraram que era desconhecida no exterior?
Resposta:
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8) Você concorda com o autor que “A
juventude brasileira não sabe o que é política, e outra vez a culpa é dos
políticos (linha 43)”? Por quê?
Resposta:
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19) O autor aponta um meio para os
políticos absterem-se do ódio do povo. Que meio é esse?
Resposta:_________________________________________________________________
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10) Mario
Sabino aponta a necessidade de colocar a casa em ordem com urgência. Segundo
ele, como isso seria possível?
Resposta:
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